24/04/2025

STF limita prazo para rescisória, e decisão não deve impactar tese do século

Por: Fernanda Valente
Fonte: Jota Tributario
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) fixou, nesta quarta-feira (23/4),
tese que define que ações rescisórias só poderão ser propostas até dois anos
após o trânsito em julgado da decisão da Corte sobre o assunto do processo,
atingindo apenas os cinco anos anteriores ao seu ajuizamento. Embora
houvesse a expectativa, o entendimento não deve impactar nas rescisórias da
"tese do século", já que os efeitos serão válidos apenas para o futuro.
O entendimento é válido para os casos em que o tribunal não modulou
especificamente os efeitos dos precedentes vinculantes. Ainda, por meio do
posicionamento, o Supremo terá mais autonomia para definir qual o prazo para
propor ações rescisórias, voltadas a anular os efeitos de entendimentos judiciais
que já transitaram em julgado.
A primeira parte da tese fixada pela Corte nesta quarta prevê que o Supremo
poderá, a depender de cada caso, modular os efeitos temporais das decisões,
restringindo a extensão do efeito retroativo dos precedentes vinculantes para
fins de ação rescisória. A Corte também pode avaliar o cabimento desse tipo de
ação considerando o "risco de lesão à segurança jurídica ou interesse social”.
Outro item da tese trata dos casos de execução de sentença e do cumprimento
de sentença contra a Fazenda Pública. O texto aprovado assegura
ao interessado o direito de alegar a inexigibilidade do título executivo judicial
baseado em interpretação ou norma já considerada inconstitucional, mesmo
que a decisão do STF tenha sido proferida antes ou depois do trânsito em
julgado da sentença, desde que não haja preclusão.
A controvérsia central no julgamento tratava dos artigos 525 e 535 do Código
de Processo Civil (CPC). Os dispositivos estabelecem prazo de dois anos para
entrar com a ação rescisória, a partir do trânsito em julgado da decisão.
Contudo, o Código também prevê que, caso uma decisão definitiva conflite
com entendimento posterior do STF, o prazo para ajuizar a ação passa a ser de
dois anos a partir da decisão da Corte.
Impactos na “tese do século”
Fontes consultadas pelo JOTA afirmam que o entendimento não deve
impactar as ações rescisórias relacionadas à "tese do século" (RE 574.706), no
qual o tribunal afastou o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. O
julgamento aconteceu em 2017, mas a modulação de efeitos foi definida apenas
em 2021.
A tributarista Carolina Oliveira Rigon, do ALS Advogados, explica que o
Supremo fixou que a interpretação dos dispositivos do CPC deve acontecer
conforme a Constituição e com efeitos ex nunc, ou seja, somente serão válidos
para o futuro. Com isso, a tese não vai valer para os precedentes vinculantes do
STF que já transitaram em julgado.
A advogada Isadora Barbar, do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de
Advogados, afirma que “as novas regras sobre o prazo para ajuizamento de
ação rescisória somente se aplicam a partir da publicação da ata do julgamento
da AR 2876”.
Para ela, “a PGFN não poderá utilizar a decisão para justificar novas ações
rescisórias com base na tese do século, se já ultrapassado o prazo de dois anos
desde a modulação da decisão em 2021. As rescisórias que não tenham sido
propostas até 2023, portanto, não poderão ser ajuizadas com fundamento nessa
nova interpretação, uma vez que os efeitos da decisão do STF são
exclusivamente prospectivos”.
A percepção é de que, a partir de agora, a União deve diminuir o número de
ações rescisórias com o objetivo de reverter decisões favoráveis. Outro
especialista ouvido sob reserva, porém, entende que ainda há a possibilidade de
a Fazenda se opor à execução do julgado pelo contribuinte, ainda que não tenha
rescisória, com base no julgamento dos embargos de declaração.
Justificativas da tese
O único trecho aprovado com ressalvas dos ministros Luiz Fux, Edson Fachin
e Dias Toffoli foi o que delimitou o prazo para o ajuizamento da ação e os
efeitos retroativos. A justificativa para o texto fixado pela maioria foi a tentativa
de estabelecer “um regime mais comedido” para conceder efeitos retroativos
de precedentes.
“O item destaca, assim, a necessidade de motivação específica do STF para a
eficácia retroativa de seu julgado, estabelecendo, ainda, um regime supletivo,
caso o precedente paradigma permaneça omisso”, diz o texto divulgado pelo
STF.
Já o terceiro item da tese foi extraído de uma nova proposta do relator, ministro
Gilmar Mendes, com o objetivo de evitar a “perpetuação de eficácia de uma
interpretação considerada constitucionalmente inadequada pela Suprema
Corte”.
O caso começou a ser analisado no plenário virtual, quando o relator votou pela
inconstitucionalidade do prazo. No entanto, a discussão foi levada para o
plenário físico por um pedido de destaque do presidente da Corte, ministro Luís
Roberto Barroso.
Nesta quarta, o presidente afirmou que a tese foi firmada a partir do ponto de
vista da maioria dos julgadores, mas não foi proclamado o resultado do
julgamento. Barroso frisou que o Plenário apenas fixou a tese na questão de
ordem. Agora, caberá a Gilmar Mendes pautar a ação rescisória, ainda sem data
prevista para o julgamento de mérito.
Confira a íntegra da tese na AR 2876
“O § 15 do art. 525 e o § 8º do art. 535 do Código de Processo Civil devem ser
interpretados conforme à Constituição, com efeitos ex nunc, no seguinte
sentido, com a declaração incidental de inconstitucionalidade do § 14 do art.
525 e do § 7º do art. 535:
1. Em cada caso, o Supremo Tribunal Federal poderá definir os efeitos
temporais de seus precedentes vinculantes e sua repercussão sobre a coisa
julgada, estabelecendo inclusive a extensão da retroação para fins da ação
rescisória ou mesmo o seu não cabimento diante do grave risco de lesão à
segurança jurídica ou ao interesse social.
2. Na ausência de manifestação expressa, os efeitos retroativos de eventual
rescisão não excederão cinco anos da data do ajuizamento da ação rescisória, a
qual deverá ser proposta no prazo decadencial de dois anos contados do
trânsito em julgado da decisão do STF.
3. O interessado poderá apresentar a arguição de inexigibilidade do título
executivo judicial amparado em norma jurídica ou interpretação jurisdicional
considerada inconstitucional pelo STF, seja a decisão do STF anterior ou
posterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda, salvo preclusão (Código
de Processo Civil, arts. 525, caput, e 535, caput).”